Leptospirose em Cães

04/11/2014 22:41

 

Revisado: 04/11/2014

Introdução

Definição

Etiologia

Patogenia

Quadro Clínico

Diagnóstico

Exames Laboratoriais

Tratamento

Prevenção

Leptospirose em Humanos

Considerações Finais

                                                            ____________________

Introdução

    Quando falamos em leptospirose lembramos imediatamente dos ratos. Esses roedores, habitantes dos esgotos, que no passado (século XIV) chegaram à Europa através dos navios trazendo pulgas contaminadas com a Pasteurella Pestis, ceifando a vida de um terço da população daquele continente (enfermidade que ficou conhecida como Peste Negra ou Peste Bubônica), são os principais transmissores da leptospirose em nosso meio.

     Tradicionalmente, os gatos são os inimigos n° 1 dos ratos, e de fato os devoram, mas raramente adquirem a doença. Os cães, por outro lado, matam esses roedores com as patas ou mesmo através de mordidas, embora não façam dessas pequenas vítimas seu alimento. Esse dado, entretanto, não é relevante quando o assunto é leptospirose uma vez que a bactéria transmissora dessa doença não se encontra na carne ou sangue do roedor, mas sim na urina.

    Isso já deixa claro que os cuidados higiênicos, que faltaram na Europa medieval, não podem ser negligenciados nas dependências onde vivem os cães. Além do asseio que deve ser empregado no espaço onde caminham e deitam esses animais, outras medidas precisam ser tomadas objetivando impedir o livre acesso dos ratos às dependências da casa, sobretudo onde se guarda a ração ou se deposita os vasilhames para água e alimentos. O resultado dessa atenção aos seus cães é decisivo quando se quer afastar a possibilidade de infecção pela leptospira.

    Vamos então estudar as características dessa doença bem como questões relativas ao tratamento, prevenção e outros detalhes.

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Definição

    A leptospirose é uma infecção causada por bactérias do gênero Leptospira. Trata-se de uma Zoonose muito comum (zoonose se refere a doenças transmitidas ao homem através dos animais: “do grego zoo = animal/ nose = doença”) que acontece mais nas épocas chuvosas ou áreas alagadas.

    É uma doença de notificação compulsória uma vez que uma epidemia pode facilmente se estabelecer quando medidas de controle não são tomadas em larga escala.

    Apesar de ser denominada “doença do rato”, outros animais, domésticos ou selvagens, podem se constituir em reservatórios para essa enfermidade, tais como guaxinins, gambás e rapozas. (Equideos, bovídeos, suínos, ovinos e caprinos são também hospedeiros da bactéria, variando as linhagens de acordo com o grupo animal). 

    A leptospirose nos cães afeta rins e fígado de forma aguda e pode provocar septicemia (infecção sistêmica). A cronicidade do quadro surge como uma complicação.

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Etiologia

    A leptospira é uma bactéria aeróbia (necessita de oxigênio) que só se multiplica dentro do hospedeiro, embora sobreviva por mais de 6 meses no meio ambiente quando as condições são satisfatórias (solo úmido ou água parada).

    Dentre as mais de duzentas estirpes de leptospira, oito causam a doença em animais de estimação e, nos cães, destacam-se como as linhagens mais frequentes quatro delas:

    Leptospira icterohaemorrhagiae, L. canícola, L. grippotyphosa e L. pomona

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Patogenia

    A penetração se dá pelas mucosas ou ferimento na pele através do contato direto entre animais ou indiretamente quando há bactérias viáveis no ambiente. A ingestão de água e alimentos contaminados constituem outras formas de contágio.

    A presença da bactéria no sangue acontece cerca de quatro dias após a contaminação. É nesse período que surgem os primeiros sintomas. Ocorrendo a septicemia, a bactéria atinge os órgãos alvo (fígado, rins, baço, sistema nervoso central e olhos). Os danos causados nesses órgãos, como a necrose tecidual hepática e colestase explicam alguns dos sintomas e sinais.

    Insuficiência renal ou hepática constituem condições muito graves que comprometem a sobrevivência do animal. Da mesma forma a septicemia e a hemólise.

    Ao final de uma semana, havendo a reação positiva do organismo através da atividade leucocitária (células de defesa) a bactéria é eliminada da corrente sanguínea, podendo se alojar em locais não alcançados pelos leucócitos (túbulos renais e córneas).

    A leptospiúria (resultante do acúmulo bacteriano nos túbulos renais) pode persistir por muito tempo (de meses a anos) servindo como fonte de contaminação do animal portador para o ambiente e outros animais. Esses casos de contaminação crônica possuem o agravante de não serem detectados pelos exames uma vez que não ativam o sistema imune, fornecendo assim resultados soronegativos. 

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Quadro Clínico

    Nos hospedeiros primários (roedores e animais silvestres) a infestação costuma ser crônica ou assintomática. No cão, que constitui um hospedeiro acidental, o quadro clínico geralmente é agudo, variando conforme o animal e a virulência da cepa bacteriana.

    Destacam-se os seguintes sinais e sintomas após um período de incubação que dura, normalmente, de 5 a 6 dias:

    Febre, petéquias ou equimoses, icterícia (gengivas, olhos), anorexia, vômitos, desidratação, poliúria, polidipsia, imobilidade, urina amarronzada.

    Esses sinais e sintomas constituem, em conjunto, apresentações clínicas que sugerem leptospirose. São elas:

    Insuficiência renal aguda, disfunção hepática, lesões oculares, gastroenterite hemorrágica e encefalite

    A evolução pode conduzir a extremos como o choque hipovolêmico e até a morte do animal.

    A forma crônica cursa com febre e conjuntivite

    Distúrbios renais e hepáticos são sequelas comuns. 

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Diagnóstico

    A detecção da bactéria no sangue ou na urina do animal fornece o diagnóstico. A presença da leptospira pode ser demonstrada também nos tecidos dos órgãos alvo.

    Anticorpos específicos devem ser pesquisados.

    Há de se ter atenção para o diagnóstico diferencial uma vez que vários dos sinais e sintomas presentes na leptospirose se apresentam em outras afecções a exemplo da Anemia hemolítica autoimune, Hepatite Viral Canina, Neoplasia (hepática, renal), Brucelose Canina e Herpesvirus.

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Exames Laboratoriais

    Os exames laboratoriais firmam o diagnóstico da leptospirose canina, evitando que o quadro clínico, que pode se mostrar de forma bem variável de acordo com a virulência da cepa e as condições do animal acometido, seja confundido com outras patologias.

    Na fase inicial da doença, as bactérias podem ser encontradas no sangue, linfa e sêmen e nos tecidos alvos. Na fase seguinte, surgem os anticorpos, e estes podem ser identificados, pois são específicos. A urocultura é importante para a detecção das bactérias na urina.

    Exames complementares demonstram as alterações causadas pela doença:

    Hemograma completo – Leucopenia, desvio para a esquerda e trombocitopenia.

    Exame de urina – Proteinúria, bilirrubinúria, piúria, glicosúria.

    Bioquímica – Azotemia, elevação de enzimas hepáticas, bilirrubina e ácidos biliares. Desequilíbrio hidroeletrolítico.

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Tratamento

    Como em qualquer patologia, o tratamento deve ser instituído o mais breve possível. Visa primariamente combater o agente causador e minimizar os sintomas e sinais clínicos.

    Com uma atuação imediata, se consegue melhores respostas do organismo do animal acometido uma vez que as defesas orgânicas, aliadas à terapia instituída, vão agir em conjunto antes que os órgãos e tecidos sejam lesionados com gravidade e a condição de cronicidade seja estabelecida.

    O tratamento é intensivo, utilizando-se antibióticos específicos contra a bactéria (penicilina, amoxicilina), soro e ainda o isolamento do animal.

    Avalia-se o funcionamento do fígado e dos rins para detectar a presença de lesões graves nesses órgãos alvo (insuficiência renal ou disfunção hepática) o que indica um mau prognóstico, havendo uma gravidade maior ainda quando se instala o choque hipovolêmico e a coagulação intravascular disseminada.

    Atenção especial deve ser dada à manutenção do funcionamento renal. Busca-se assim aumentar o fluxo sanguíneo nos rins (administração de fluidos, manitol, furosemida).

    A hemodiálise é aplicada em casos severos.

    Quando a função renal está comprometida, evita-se medicações que exigem, para a excreção dos seus metabólitos, o restabelecimento desse sistema. É o caso dos aminoglicosídeos e da estreptomicina.

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Prevenção

    Na prática, é muito difícil impedir o aparecimento dos roedores. Pode-se colocar ralos nos escoadouros e obstruir qualquer outro caminho de possível entrada como frestas, espaços sob portões etc. Além disso, para não criar atrativos aos ratos, se deve evitar acúmulo de lixo, restos de comida, ração dos animais expostas durante a noite.  Um cuidado de extrema importância é a troca diária da água contida nos bebedouros, lavando-os sempre, pois nela pode haver a contaminação pela leptospira.

    Os vasilhames bem como a ração devem estar em locais inacessíveis aos ratos. Há um suporte para comedouros e bebedouros que consiste em uma haste presa ao chão com uma base e possuindo segmentos laterais para acoplar as vasilhas.

    A vacinação, entretanto, é a providência mais importante uma vez que protege os animais mesmo que haja a contaminação. Ela deve ser realizada regularmente (todo ano), com reforços a cada seis meses em regiões endêmicas.

    Importante lembrar que a vacina não impede a instalação de infeção subclínica.

    Para que sejam submetidos à vacinação, os cães devem estar em boas condições de saúde. (bem nutridos, livre de parasitoses), pois a debilidade apresentada nesses casos dificulta a resposta imunológica, elemento básico para que a vacinação obtenha resultados.

    Cães sadios podem ser vacinados a partir de seis semanas de idade.

    É preciso ressaltar a alta gravidade dessa doença, o que justifica todos os esforços para evitar que ela se estabeleça.

    Uma conduta muito importante é a de se impedir que os cães deixem os espaços onde vivem (áreas e quintais) e ganhem a rua para passeios nas épocas chuvosas, onde o contato com água acumulada e lixo acontece inevitavelmente.

    Em algumas situações onde se sabe da existência de casos na região, o uso de amoxicilina ou doxiciclina (7 a 10 dias) de forma profilática pode ser recomendado.

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Leptospirose em Humanos

    Em 1800, no Cairo, pode ter surgido o primeiro relato de leptospirose no homem, tendo sido observado, na ocasião, a presença de febre, icterícia, hemorragias e petéquias. O contato com esgotos foi se tornando uma particularidade importante nos novos casos que surgiram.

    As primeiras observações no Brasil datam de 1818.

    Por volta de 1946 aconteceram surtos epidêmicos em Porto Alegre e Paraná.

    Surtos de maiores proporções aconteceram em outras cidades (ex: Recife, 1970 e São Paulo, 1991).

    Febre, dores musculares, dores de cabeça, tremores, dor articular e conjuntivite são alguns dos sinais e sintomas da leptospirose em humanos. Na grande maioria dos casos (80%) o homem adquire essa patologia através da água contaminada. Isso é particularmente notado em áreas alagadas.

    Muitos animais além dos cães, que convivem com o homem, também representam fontes de contágio através da urina (equídeos, bovídeos, suínos, caprinos e ovinos).

    Pode adquirir também pelo contato com o cão doente. Assim, o uso de luvas e vestimentas adequadas visa diminuir as chances de contágio. Lembre-se que a urina e o sangue do seu animal acometido de leptospirose contem a bactéria e podem transmiti-la a você.

    Um detalhe de grande importância é o fato de um cão devidamente vacinado se constituir em disseminador da doença ao homem. Isso ocorre porque a vacina não impede que o animal adquira a doença de forma subclínica, fazendo dele uma fonte de contágio. Tudo isso mostra que os cuidados em se evitar a contaminação dos cães são de extrema importância para a saúde do homem no que diz respeito à leptospirose. 

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Considerações Finais

    Nas épocas chuvosas, os ratos proliferam fora do seu habitat natural, buscando alimentos em quintais, depósitos etc.

    Regiões alagadas ou sem saneamento básico são altamente propensas ao alastramento dessa enfermidade.

    Os cães errantes, obrigados a se alimentar de restos de lixo e a saciar a sede em poças d’água, são propensos a adquirir a doença e respondem por grande parcela da transmissão dessa enfermidade ao homem

    Habitue-se sempre a observar seus cães. Quando eles estão calmos e você tem a oportunidade de lhes oferecer carinho, faça-o com “segundas intenções” procurando qualquer anormalidade. É desse modo que se descobre a presença de feridas, carrapatos, pulgas e, no caso da leptospirose, os sinais indicativos de que ela pode ter se instalado. É o caso de se perceber amarelamento nas mucosas (gengivas, olhos).

    Isso é ainda mais importante se o animal apresenta febre, vômitos, apatia, perda de apetite. Obviamente o animal deve ser devidamente examinado por um veterinário para que o diagnóstico seja firmado e a terapia instituída.

    Devemos deixar claro que nem todos os ratos são portadores da bactéria. Assim, se seu cão matou um desses roedores, é preciso leva-lo ao veterinário para que os exames sejam feitos. 

Para finalisar, é preciso deixar claro que, se em uma determinada região não houver casos confirmados de leptospirose canina, isso minimiza as preocupações, mas não diminui a necessidade das medidas preventivas citadas acima, sobretudo no que diz respeito à higiene do local onde os cães vivem. Há outras doenças, e a conservação da saúde do seu animal depende de todos os cuidados no sentido de fornecer a ele um ambiente limpo, livre dos ratos e de outras ameaças em potencial. 

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